A Petrobras (PETR4) entregou um resultado no segundo trimestre sem grandes surpresas, e mesmo assim viu suas ações despencarem -6% em um único pregão. No ano, a queda acumulada aproxima-se de -18%. O motivo?
A sinalização de que ela pode voltar a um negócio de margens apertadas e um cheirinho de interferência política no ar.
Mas para entender melhor essa reação negativa, precisamos voltar alguns anos no tempo.
No dia 23 de dezembro de 2020, a Petrobras deu um presentão de Natal aos seus acionistas: vendeu a Liquigaz por R$ 4 bilhões.
Presentão porque o múltiplo foi bastante interessante (perto de 12 vezes o ebitda), mas principalmente porque o segmento não era muito lucrativo.
O negócio de distribuição de gás para varejo é complexo, exige muita eficiência logística e muita disciplina de gastos, o que convenhamos não é o forte de estatais.
Basta olhar para os retornos apertados da Liquigaz na época da venda, que tinha margem ebitda de 6% e margem de lucro menor do que 3%.
Apenas como comparação o segmento de Exploração e Produção (E&P) de petróleo tem margem ebitda superior a 50% e margem de lucro acima de 30%!
Os investimentos em E&P são obviamente muito maiores, mas esse não é um problema para a Petrobras, que gera muito caixa. Sendo assim, ela sempre deveria optar por colocar dinheiro naquilo que traz mais retorno: não é o caso de distribuição de GLP.
Bem, essa má alocação de capital ajuda a entender um pouco o mau humor após o anúncio da intenção de voltar ao negócio de distribuição, mas ainda não explica uma perda de R$ 32 bilhões de valor em um único dia. E assim chegamos a uma velha preocupação dos acionistas da Petrobras.
O anúncio traz uma série de perguntas sem respostas para os acionistas. Por que a Petrobras decidiu voltar ao segmento de distribuição de gás tão perto das eleições? Por que justamente depois de tantas e tantas críticas de Lula aos preços do gás?
Será que a volta da companhia ao segmento é um pedido do presidente, com o intuito de baixar na marra os preços? Ou será que tudo isso não passa de uma grande coincidência?
Na teleconferência de resultados, a CEO da Petrobras, Magda Chambriard, deu uma justificativa razoável, dizendo que o movimento está de acordo com a expectativa de crescimento de produção e da maior necessidade de escoamento de gás nos próximos anos, quando ela precisará ter flexibilidade para comercializar esse volume extra.
Na verdade, a Petrobras já atua na venda direta de gás para algumas grandes empresas (como a Vale) e a ampliação dessa atuação não seria um grande problema.
A questão é se a companhia realmente tiver a intenção de retornar à distribuição de GLP para pequenos consumidores, pois isso exigirá grandes investimentos logísticos, compra de botijões, marketing, rede de distribuição, etc. E como você já sabe, mais investimentos em segmentos de baixo retorno também significa menos dividendos.
Mas o agravante é o receio de que esse retorno venha casado com medidas populistas do governo para tentar baratear o preço, fazendo a Petrobras vender gás abaixo do custo, assim como já aconteceu com a gasolina no governo Dilma.
Por fim, existe o risco de que esse movimento abra a porta para a companhia voltar também à distribuição de diesel e gasolina no futuro, outro segmento de margens apertadas, difíceis para uma estatal operar e que também aumentariam as chances de interferência do governo.
A forte queda das ações da Petrobras tem menos relação com resultados e dividendos do segundo trimestre, e mais a ver com perspectivas de entrada em segmentos menos rentáveis no futuro, além de possíveis interferências políticas.
Como dizem, cachorro mordido por cobra tem medo de linguiça, e o passado ainda pesa no sentimento dos acionistas. Por outro lado, diferente de 2014, a Petrobras hoje é protegida pela Lei das Estatais, que coíbe (e pune) prejuízos nas estatais provocados por motivos políticos.
E mesmo que a rentabilidade consolidada diminua pela entrada em um segmento de margens menores, o segmento de distribuição de GLP seria pouco representativo no todo – apenas como curiosidade, a Liquigaz foi vendida por R$ 4 bilhões, e mesmo que estivesse valendo o dobro hoje, ainda seria muito menos que os R$ 400 bilhões de valor de mercado da própria Petrobras – mesmo depois da tal desvalorização de R$ 32 bilhões.
Por fim, vale lembrar que essa preocupação com a má alocação de capital pode mudar completamente caso tenhamos uma mudança para um governo reformista e menos populista, o que implicaria em um belo re-rating para os papéis.
Por 3,8 vezes lucros e um dividend yield de 12%, a Petrobras já parece embutir bastante pessimismo nos preços atuais, e pode fazer sentido em uma carteira de renda diversificada. Por isso os papéis fazem parte da Carteira de Dividendos do BTG Pactual, que você pode conferir em detalhes de forma gratuita aqui.
Por Paulo Nascimento Filho, empresário, assessor de investimentos pela Ancord, influenciador e criador de conteúdo sobre finanças e educação financeira.
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