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Juro sozinho não será suficiente


  • Olhar Econômico
  • 18 de Dezembro de 2024 | 08h18
 Foto: Reprodução/Senado Notícias
Foto: Reprodução/Senado Notícias

Semana sob forte pressão no mercado financeiro, com o aumento das preocupações em relação à situação fiscal brasileira.

Nem mesmo a postura firme do Banco Central (BC), que semana passada elevou a Selic em 1% e sinalizou mais duas altas de mesma magnitude para o início de 2025, foi suficiente para acalmar o câmbio e a curva de juros futuros.

Apesar da tentativa do BC de reancorar as expectativas inflacionárias com um aperto monetário agressivo, o real continua se desvalorizando e os juros futuros voltaram a disparar.

Esse movimento é reflexo, principalmente, de dois fatores preocupantes: primeiro, a incerteza em torno da aprovação do pacote fiscal no Congresso.

Segundo, o risco cada vez mais presente de o país caminhar para um cenário de dominância fiscal, tema que vem ganhando relevância nas discussões econômicas recentes.

Dominância fiscal é o fenômeno em que a política fiscal sobrepõe ou restringe a política monetária.

Nesse cenário, o Banco Central perde sua autonomia para controlar efetivamente a inflação e a taxa de juros, pois suas decisões passam a ser condicionadas pela necessidade de financiar déficits fiscais elevados ou administrar uma dívida pública em trajetória insustentável.

A consequência é uma dinâmica perversa: quanto mais precária a situação fiscal, maiores são os juros exigidos pelo mercado, o que, por sua vez, aumenta os custos com o serviço da dívida e aprofunda o déficit fiscal — uma espiral negativa que alimenta a desconfiança e amplia as pressões inflacionárias.

O ajuste macroeconômico, que deveria se concentrar no aumento dos juros para conter as pressões inflacionárias, acaba recaindo sobre a inflação em si, à medida que a perda de controle cambial agrava a situação.

Esse desdobramento leva a uma dinâmica preocupante que remete a cenários observados em países como Turquia e Argentina — exemplos claros de políticas desastrosas.

Embora o Brasil ainda não tenha atingido esse ponto crítico, os sinais emitidos recentemente acendem um alerta claro sobre a urgência de ajustes fiscais mais robustos.

O atraso na apresentação do pacote de contenção de gastos e a entrega de uma proposta aquém das expectativas colocaram o governo em um caminho árduo e perigoso até 2026, ano eleitoral.

Adiar medidas estruturais de grande impacto agravou a complexidade do cenário, exigindo agora um esforço ainda maior para reverter o quadro e restaurar a credibilidade.

A crescente desconfiança sobre a sustentabilidade fiscal agrava os desequilíbrios macroeconômicos, que, por sua vez, alimentam ainda mais o pessimismo em relação ao país.

Como muito bem observou Marcos Mendes, a política fiscal brasileira segue sem lastro, alimentando o ceticismo do mercado em relação à capacidade do governo de aprovar o pacote fiscal proposto ainda neste ano.

Além disso, pairam dúvidas consideráveis de que, mesmo se aprovado, o texto passará sem sofrer desidratações substanciais.

Como dito acima, ainda não atingimos um ponto de não retorno, mas avançamos perigosamente na direção de um beco sem saída.

A solução é clara e inquestionável: o ajuste fiscal precisa ocorrer pelo corte efetivo de gastos. Insistir em alternativas superficiais ou paliativas equivale a dar murro em ponta de faca.

Sem uma mudança estrutural, os esforços do Banco Central, como o aumento da Selic, tornam-se ineficazes.

No atual contexto, mesmo intervenções cambiais, com leilões de venda das reservas de dólares brasileiras não surtem efeito, como temos visto nos últimos dias.

Ao adiar a implementação de um ajuste fiscal robusto e estrutural, o governo fez a escolha de atravessar uma ponte esburacada em direção a 2026, em vez de pavimentar um caminho sólido e confiável ao apresentar, em tempo hábil, um pacote fiscal crível e adequado.

O resultado é um cenário de crescente deterioração nos ativos de risco, com aumento da pressão sobre o câmbio e a curva de juros, além de um ambiente econômico instável.

O momento exige pragmatismo, decisões técnicas e, sobretudo, coragem política para corrigir a rota antes que o país entre em uma espiral de desconfiança irreversível.

Por Paulo Nascimento Filho, empresário, assessor de investimentos pela Ancord, influenciador e criador de conteúdo sobre finanças e educação financeira.

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