Após longa espera, na última semana o Federal Reserve finalmente encerrou as especulações e efetuou um corte significativo nas taxas de juros, reduzindo-as para o patamar entre 4,75% e 5,00%. Esse movimento, aguardado há bastante tempo, deu início ao ciclo de afrouxamento monetário nos EUA, anteriormente previsto para começar em 2023, mas sucessivamente adiado.
Se a história nos serve de guia, com a ausência de sinais claros de recessão no horizonte, a redução das taxas por lá deveria ser vista como um estímulo positivo para ativos de risco, especialmente para mercados emergentes como o Brasil, que tem sofrido com o impacto das taxas elevadas nas economias desenvolvidas. Em teoria, essa mudança deveria ser motivo de otimismo.
No entanto, o cenário no Brasil seguiu em uma direção oposta.
O Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu elevar a taxa Selic em 0,25%, sinalizando ainda a possibilidade de novos aumentos até o final do ano.
Contudo, os desafios enfrentados pelo país vão além da política monetária.
O verdadeiro obstáculo para a economia brasileira não é apenas a alta dos juros, mas sim a fragilidade fiscal que ameaça sua estabilidade de forma mais profunda.
A decisão do Banco Central de adotar uma postura mais agressiva, com a perspectiva de futuras elevações da Selic, tem como objetivo não apenas combater pressões inflacionárias, mas também ancorar novamente as expectativas de inflação futura.
No entanto, sem um ajuste fiscal sólido, essas medidas monetárias isoladas serão insuficientes para alcançar os resultados desejados.
Aumentar os juros, sem um controle efetivo dos gastos públicos, não resolverá o problema. O desequilíbrio fiscal continua sendo o principal fator de preocupação na economia.
Na última sexta-feira, a situação se agravou com a divulgação do relatório bimestral de receitas e despesas do governo, quando se esperava o anúncio de medidas de contenção de gastos na faixa de R$ 5 a R$ 10 bilhões.
Contudo, a realidade foi bem menos rigorosa. Ao contrário do que se aguardava, o governo aumentou o bloqueio orçamentário em apenas R$ 2,1 bilhões, totalizando R$ 13,3 bilhões, um montante bem abaixo das expectativas.
Além disso, reverteu um contingenciamento anterior de R$ 3,8 bilhões, o que, na prática, representou um afrouxamento fiscal adicional de R$ 1,7 bilhão frente ao último relatório, ao invés de um esforço de ajuste mais rigoroso.
Em vez de adotar um ajuste fiscal, o governo optou por adiar as decisões mais duras para o último relatório bimestral do ano, previsto para 22 de novembro.
A reação negativa se intensificou no início desta semana, como refletido no relatório Focus, destacando o aumento da desconfiança quanto à capacidade do governo de cumprir suas promessas fiscais e manter sua credibilidade.
O boletim revisou as expectativas para a taxa Selic em 2024, elevando de 11,25% para 11,50%. Para 2025, a expectativa da Selic permaneceu em 10,50%, enquanto as projeções de inflação para 2024 e 2025 foram ajustadas para cima.
Ocorre que a falta de ações concretas e a demora em adotar medidas eficazes têm impactado negativamente a confiança do mercado.
A política fiscal frouxa, por sua vez, exige uma política monetária mais severa, com juros elevados que acabam prejudicando o desempenho de ativos como as ações. Essa falta de comprometimento com o ajuste fiscal reforça a visão negativa dos investidores sobre a gestão do país.
Embora o real já possa demonstrar sinais de valorização devido à combinação entre os cortes nas taxas do Federal Reserve e o aumento da Selic, um fortalecimento mais expressivo da moeda brasileira — possivelmente em direção a R$ 5 por dólar — dependerá de um compromisso mais firme do governo com a sustentabilidade fiscal.
Sem dúvida, até 2026, as políticas mais frouxas do Federal Reserve poderiam servir de base para um maior otimismo no mercado brasileiro.
Contudo, para um país preso em um ciclo de mediocridade, não existe uma "solução final".
Assim, como já ressaltado, o aumento dos juros por aqui, isoladamente, não será suficiente sem um compromisso firme do governo com a responsabilidade fiscal.
Por Paulo Nascimento Filho, empresário, assessor de investimentos pela Ancord, influenciador e criador de conteúdo sobre finanças e educação financeira.
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