No início do mês fui ao barbeiro e enquanto cortava meu cabelo, Ricardo me contou que planejava dar um "presente legal" de dia dos namorados para sua amada. Mas havia um grande problema: ele estava sem dinheiro.
Eu podia bancar o conselheiro chato e dizer que se ela realmente gostava dele, não iria se importar em ganhar algo mais simples, mas preferi ficar na minha – existem coisas que precisamos vivenciar para aprender.
Dado o problema – falta de grana – e a necessidade de impressionar a garota, seria preciso então encontrar uma solução. A mais óbvia: cortar gastos do mês para sobrar para o presente. Como? Não sei, talvez levar comida de casa, ir de bicicleta para o trabalho, cortar a academia, entre outros.
Mas não era isso que ele tinha em mente. Meu barbeiro tinha um plano “infalível”.
— "Paulinho, fica tranquilo porque eu já pensei em tudo. Vou dedicar esses próximos dias pra encontrar uma estratégia top no jogo do tigrinho. Qualquer quinhentão que ganhar já ajuda."
Mais uma vez, preferi não bancar o "palestrinha" e também não vou entrar na discussão de se vale a pena ou não apostar nesses jogos. A questão mais importante é que não dá para se comprometer com um gasto se a receita é tão incerta.
Não sei exatamente qual foi o fim dessa história, mas suspeito que o plano não deu muito certo.
Trato aqui de um caso real e meu barbeiro não parece ser o único a planejar gastos apostando em um dinheiro que nem sabe se vai existir.
Justamente no dia dos namorados, o presidente Lula disse que tinha um plano para bancar os gastos do país. Eles seriam cobertos com mais arrecadação (leia-se impostos), o que gerou uma onda de pessimismo no mercado, fez a bolsa cair, o dólar subir e a curva de juros futuros disparar.
Primeiro porque o empresariado tem se mostrado extremamente descontente com o aumento dos tributos, e não se sabe realmente se dá para o governo contar com um aumento na arrecadação – aliás, a reação contrária à MP do Pis/Cofins é uma prova disso.
Segundo porque o corte de gastos, que seria a via mais na mão e fiscalmente responsável, nem sequer foi citado pelo presidente.
Fato é que a bolsa voltou para os menores níveis desde novembro de 2023, com sérios receios de que a coisa iria desandar de vez. Mas será que podemos apostar nesse cenário?
Certa vez o ex-ministro Paulo Guedes resumiu, o Brasil é um país que vive em uma espécie de cercadinho. Se as condições estão boas demais, o governo abre a caixa de maldades para gastar mais do que pode, levando os mercados para baixo.
Essa é a parte ruim da tese do cercadinho. A parte boa é que ela também funciona para o outro lado. Quando o sentimento está muito ruim e a coisa parece estar perto de desandar de vez, começamos a notar uma espécie de união de forças para tentar livrar o país de um risco de ruptura.
Depois de uma enxurrada de notícias negativas, começo a notar uma melhora.
Para começar, os membros do COPOM voltaram a falar a mesma língua na reunião da semana passada. E logo depois das declarações de Lula sobre arrecadação, os ministros Haddad e Tebet apareceram na mídia para dizer que o governo defende, sim, uma revisão ampla dos gastos.
Ainda não é o suficiente para fazer o investidor voltar para a bolsa, mas já ajuda a estancar a sangria. Além disso, é importante lembrar que apesar de um cenário macro turbulento, as empresas seguem mostrando evolução de resultados.
Depois de um 2023 difícil, o lucro das empresas que compõem o Ibovespa deve crescer 19% em 2024, 8% em 2025 e 9% em 2026, de acordo com as estimativas da Bloomberg.
Isso, combinado com múltiplos muito baixos, traz duas outras vantagens para os investidores.
Primeiro, valuations baixos tendem a oferecer uma boa margem de segurança caso o cenário não melhore tão cedo.
Segundo, se a tese do cercadinho se mostrar válida mais uma vez, o que acredito ser provável, o humor voltará a melhorar e as ações contarão com um amplo espaço para valorização, dado que partem de valuations bastante deprimidos.
Ninguém sabe se depois de tanta notícia ruim o humor finalmente vai voltar a melhorar. O que eu sei é que nos patamares atuais o risco vs retorno da bolsa brasileira parece muito atrativo, e mesmo que a recuperação demore um pouco, o potencial de valorização no longo prazo é grande.
Por Paulo Nascimento Filho, empresário, assessor de investimentos pela Ancord, influenciador e criador de conteúdo sobre finanças e educação financeira.
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