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O mal não falado


  • Olhar Econômico
  • 01 de Maio de 2024 | 09h03
 Foto: Reprodução
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Gestores de ações têm certeza de que agora a Bolsa vai subir. Está muito barato depois do longo Bear Market doméstico. Os juros vão cair, aqui e lá fora, nos próximos meses. Isso é inexoravelmente bom para ativos de risco de mercados emergentes.

Já os gestores de fundos globais preferem a posição vendida. Bolsa no Brasil é coisa ruim, dizem eles. O tal do juro americano mais alto veio mesmo para ficar e o fiscal brasileiro, que já é estruturalmente ruim, convive com um Executivo perdulário e uma Congresso interessado na PEC do quinquênio.

A hipótese de uma combinação dos dois parece a mais provável. Quem poderá nos defender?

Você piscou e já estamos em uma nova temporada de resultados trimestrais e, em breve, teremos Copom de novo. Sem contar que o prazo final do Imposto de Renda 2024 está se aproximando. 

Após dias de turbulência com a alta do dólar e o inesperado embate entre Elon Musk e Alexandre de Moraes, podemos dizer que a última semana foi até mais tranquila. 

Nas minhas tentativas de diagnosticar o comportamento dos mercados e esboçar algum prognóstico plausível, vejo um reme-reme borocoxô sem grandes perspectivas, ao menos até que os juros realmente caiam nos EUA.

Ocorre que não há sensação de progresso. Ao contrário, há grande percepção de paralisia, seja envolvendo a política monetária nos EUA, seja com a dinâmica fiscal ou da produtividade brasileira.

Haveria alguma forma de rompermos o desânimo e, pragmaticamente, ganharmos algum dinheiro enquanto isso?

Existe uma máxima na incorporação imobiliária que poderia ser aplicada no mercado financeiro: “dinheiro grosso você faz na hora que compra, não na hora que vende."

O mais importante do processo seria a compra do terreno. Ali que você gera o maior valor na cadeia (obviamente, não quer dizer que as demais partes não sejam importantes). Replicando a ideia, cada vez que você faz uma boa compra em Bolsa, está, sim, avançando.

É uma preparação efetiva e concreta para um resultado futuro, como quando um agricultor espalha adequadamente suas sementes e seus defensivos. Dentro do processo como um todo, ali está o progresso.

Ter a chance de comprar juro real de longo prazo acima de 6% ou ações de altíssima qualidade com retornos prospectivos tão altos é, em si, um fator de evolução.

Além disso, uma alternativa à obstinação com a falta de avanço sistêmico seria adotar a estratégia do desvio. Se o macro não está ajudando, podemos focar no microeconômico. Se os juros não vão cair no curtíssimo prazo lá fora e o Brasil como um todo não oferece uma narrativa atraente, dificultando uma reavaliação geral de nossos ativos, podemos nos debruçar sobre os avanços dos lucros — e essa é uma dinâmica, quase por essência, microeconômica, de empresa por empresa.

Os primeiros balanços do 1T24 já começaram a sair no exterior e também aqui no Brasil. Deveríamos entrar numa fase do ciclo em que os lucros corporativos fazem mais preço. Perseguir nomes com melhora operacional destacada pode oferecer retornos atraentes ainda que os mercados como um todo não estejam brilhantes.

Em paralelo, há uma série de mudanças de ordem microeconômicas acontecendo enquanto somos acometidos pela sensação de paralisia.

A regulação da reforma tributária trouxe enorme volatilidade para as ações de shoppings, enquanto, no final do dia, o impacto material sobre o FFO (sigla para “Funds From Operations”, em português algo como “fluxo de caixa proveniente das operações”) das empresas deve ser marginal — Iguatemi sofreu tremendamente na última semana, mas pode ser o grande destaque desta temporada de resultados no segmento. Oportunidade clássica.

As incorporadoras de baixa renda saíram ainda melhores também, reforçando seu caráter antifrágil — elas acabam se beneficiando de um governo intervencionista e apaixonado por subsídios. 

Neste sentido, ao analisarmos as atitudes do Lula III desde as últimas eleições presidenciais, vejo um nítido "bate e assopra". Recorrentemente, o presidente tem flertado até o limite com a esquerda radical, para então voltar ao centro (e ao Centrão) quando a corda está prestes a estourar.

Mais recentemente, podemos interpretar que o gatilho para a volta ao Centrão se deu pela insatisfação pública de Arthur Lira com Padilha & Cia.

Já a volta ao centro econômico esteve associada à revisão do arcabouço fiscal justamente no infeliz contexto de retomada dos juros americanos, e se traduziu (também) em estresse cambial.

Aliás, a língua do câmbio é uma língua que Lula entende bem, e é capaz de sensibilizar até mesmo Gleisi Hoffmann.

Um líder de esquerda pode até argumentar que o mercado acionário é reduto da elite, altamente especulativo, e funciona conforme os caprichos dos Faria Limers; pode até dizer que não dá para confiar em suas sinalizações.

Agora, estresse no câmbio é um termômetro que pega geral. 

A velha sabedoria do Mário Henrique Simonsen continua valendo: “a inflação aleija, o câmbio mata".

Então, já começamos a ver as primeiras instruções no sentido de reatar diálogos políticos, desarmar novas bombas fiscais, liberar dividendos da Petrobras e resgatar a Aneel.

Enquanto seguimos com um hobby aqui, outro ali, daqui a pouco é 2026.

Por Paulo Nascimento Filho, empresário, assessor de investimentos pela Ancord, influenciador e criador de conteúdo sobre finanças e educação financeira.

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