Chegamos a mais uma Super Quarta de maneira muito diferente de como pensávamos que chegaríamos há algumas semanas, com mudança radical nos contextos doméstico e internacional, o que provoca alterações no balanço de riscos.
O mundo ainda está na ressaca pós-pandemia (aquele inferno acabou, mas ainda sofremos as sequelas de todo o processo).
Passamos por um movimento de aperto monetário relevante em quase todos os países, o que tem como consequência uma provável recessão econômica neste ano. Não há como fugir, faz parte do livro-texto de economia (nem todos foram superados como algumas autoridades comentam equivocadamente).
No âmbito internacional, vivemos um estresse bancário como há muito tempo não se via. Conforme artigo da última semana, abordei como a quebra dos bancos tidos como regionais (pequenos ou de médio porte) nos EUA provocou um sentimento ruim nos mercados, com lembranças da crise de 2008.
Não vejo um cenário propício para caminharmos na mesma direção da Grande Crise Financeira, mas isso não significa que as coisas serão fáceis. Pelo contrário. Provavelmente teremos recessão. Resta saber sua profundidade e duração.
Para isso, já devemos ter algum direcionamento do Federal Reserve (Fed) hoje sobre para onde ele quer levar a economia americana. Jerome Powell, o presidente do Fed, errou ao colocar na mesa a possibilidade de voltar a acelerar o aperto monetário.
Agora, as opiniões estão divididas sobre as táticas que o banco central deve adotar diante dos eventos recentes, com parte do mercado esperando que o Fed mantenha inalterada a taxa. Não tenho esse como meu cenário. Vejo como mais provável uma elevação 0,25 pontos mesmo.
Contudo, é bem possível que, depois da alta desta semana, o Fed avalie finalizar o processo de aperto monetário, mesmo que a inflação continue em patamares elevados, muito por conta dos eventos recentes com os bancos nos EUA e na Europa.
Neste sentido, a maior preocupação realmente está com os bancos regionais americanos, que juntos representam cerca de 40% de todo o crédito nos EUA. Ao analisar os dados, devemos dar uma atenção especial para o First Republic Bank, cuja ação caiu mais de 90% desde o começo de fevereiro. Talvez o esforço coletivo dos grandes bancos não seja o suficiente para salvar a instituição, provocando mais uma quebra.
Se parar por aí, mesmo que negativo, ainda não é vetor sistêmico. Mas as coisas podem piorar rápido, por isso uma antecipação do fim do aperto monetário é provável.
Situação não é trivial no Brasil
Olhando para o Brasil, a situação também não é das mais triviais. O governo voltou a atrapalhar o próprio país. Já era para termos em mãos o novo arcabouço fiscal antes do Comitê de Política Monetária (Copom) começar. Não foi o caso.
Aliás, ao que tudo indica, novos problemas nasceram entre a ala política e a econômica na reunião da última sexta-feira no Palácio do Planalto, quando Haddad teria apresentado a nova regra fiscal ao Lula — há pressão para maior flexibilização, sugerindo mais gasto.
Isso é péssimo.
Lembro que o quadro fiscal é o calcanhar de Aquiles do país, não parecendo haver interesse de algumas alas do governo em resolver o problema. Querem mais gastos, sem compromisso, e menos juros. Precisa explicar que não é assim que funciona e, caso optem por trilhar esse caminho, a Argentina é logo aí, perseguindo com obstinação os erros que acabaram com o governo Dilma.
Sem um arcabouço definido, o Banco Central tem menos argumentos para flexibilizar a política monetária, apertando ainda mais as condições financeiras brasileiras e piorando nosso cenário econômico. A indefinição de um substituto do teto pressiona a curva de juros para cima, sangrando ativos brasileiros. E vale destacar que a percepção tinha melhorado recentemente.
Lula erra ao caminhar pelo mesmo caminho de Dilma, ouvindo demais algumas personalidades do PT, como Gleisi Hoffmann, completamente desligada da realidade.
Haverá mais conversas sobre o tema, principalmente depois que o ministro da Fazenda foi aos presidentes das casas legislativas pedindo apoio das lideranças contra os ataques do PT — sim, a Fazenda, comandada por um petista (o mais tucano dos petistas, mas ainda assim), quer se defender do próprio PT. Esquizofrenia coletiva severa. A ver.
Por Paulo Nascimento Filho, empresário, assessor de investimentos pela Ancord, influenciador e criador de conteúdo sobre finanças e educação financeira.
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