Na última sexta-feira, o mercado financeiro finalmente obteve a confirmação de que Fernando Haddad, ex-prefeito de São Paulo e ex-ministro da Educação, será o próximo ministro da Fazenda.
O atual Ministério da Economia será desmembrado para seu perfil anterior, com Fazenda, Planejamento (Planejamento, Orçamento e Gestão) e Indústria (Desenvolvimento, Indústria e Comércio). Era um nome amplamente esperado, depois do volátil mês de novembro.
Sim, Haddad está longe de ser a melhor escolha, ou pelo menos o melhor nome na visão do mercado. Mas convenhamos que ele está bem distante do pior dos mundos. Lula ao levar em consideração apenas nomes petistas para o cargo, a escolha do ex-prefeito acaba sendo mais pessoal do que partidária e pode representar uma esquerda mais moderna e menos ideologizada, que não nega a ciência econômica.
Fernando já comanda as discussões de Orçamento relacionadas com a PEC da Transição. Os próximos temas deverão ser o arcabouço fiscal, a reforma tributária e o acordo UE-Mercosul.
Importante ficar claro que o Brasil precisa de uma nova regra fiscal, uma vez que o teto de gastos não existe mais como foi concebido durante o governo Temer. Ou seja, teremos que desenhar em 2023 uma nova âncora fiscal, com a qual Haddad prometeu que ouviria técnicos do Tesouro e economistas.
Ao analisar o perfil do novo ministro, apesar dos ruídos, analistas de mercado estimam espaço para algo construtivo. O argumento deve-se ao histórico durante sua gestão na Prefeitura de São Paulo na qual não foi irresponsável do ponto de vista fiscal. Particularmente não sou admirador da gestão Haddad, mas sobre a gestão do orçamento, contra fatos não há argumentos. Pelo contrário.
À época, tornou-se o primeiro prefeito a conseguir grau de investimento do país, apesar da crise de 2015-16. O reconhecimento das agências de risco veio em grande parte ao esforço de renegociação da dívida (caiu de R$ 79 para R$ 29 bilhões) e aos bons parâmetros de gastos de sua gestão, que recebeu críticas do próprio PT por "não gastar o suficiente". Inclusive em ano eleitoral, quando perdeu já no primeiro turno para João Dória.
Dito isso, se caminharmos para uma versão do que foi o Palocci no primeiro governo Lula, talvez os investidores estejam reagindo de maneira exagerada, até porque o nome de Haddad na Fazenda pode não sinalizar nada além de equilíbrio entre demandas sociais e responsabilidade fiscal, indicando diálogo.
Em outras palavras, podemos ter um discurso em favor da reforma tributária e da sustentabilidade fiscal, com apresentação de nomes respeitados pelo mercado para o segundo escalão.
Sempre bom lembrar que na média, o mercado é um péssimo avaliador de notícias políticas. Por isso que, nas últimas semanas, convivemos com uma elevação de volatilidade verificada sobre os ativos, afinal há um considerável nível de incerteza no ar.
Não precisa ser construtivo com o governo Lula para entender que a situação do país não é necessariamente explosiva, mas também não é confortável. Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), a dívida bruta do Brasil atingiu 93,0% do PIB em 2021 e 91,9% do PIB em 2022, a mais alta entre os mercados emergentes. Precisaremos de uma reforma tributária, com uma remodelação do orçamento em si, hoje muito engessado.
Porém, não posso negar que os primeiros sinais do governo eleito não sejam positivos sob a perspectiva fiscal. Depois de uma primeira semana boa para os mercados após eleição, em que o capital internacional se preparava para migrar ao Brasil e Lula era recebido com festa na COP-27, o presidente eleito arriscou atirar no próprio pé. Ao colocar responsabilidade fiscal como antagônica à social, flertou com juros de 15% e câmbio de R$ 6, com consequências nefastas para os mais pobres. Sinais preocupantes, sem dúvida.
Mas há ponderações a serem feitas. Em primeiro lugar, ainda há muita retórica; afinal, apesar de diplomados, Lula e Alckmin ainda não assumiram. Depois, teremos o Congresso mais à direita e ideológico em 2023, o que poderia significar mais dificuldade para negociações à frente.
Lula sabe que a inflação pega na veia seu eleitorado e pode reviver Bolsonaro em 2026. Sem a economia, portanto, nada feito. Mesmo diante disso, ele colocou seu “provável sucessor” na pasta mais difícil e pesada do governo. Economistas costumam dizer que o cargo de ministro da Fazenda seja o pior emprego do mundo.
Em outras palavras, podemos estar diante de um adulto Haddad, ao invés de um menino (ideologizado com discurso universitário). Exemplo disso está na sua atuação com a equipe de transição, onde fez dobradinha com Alckmin, de quem já era próximo. O que também o coloca próximo de Pérsio Arida, ainda que como conselheiro informal apenas. Sim, podemos sonhar.
De prático, resta aguardar com atenção a nomeação de seus secretários pois será importante para entendermos os rumos da política econômica. Como disse Mansueto Almeida em entrevista recente, vale o benefício da dúvida. Se repetirmos algo semelhante à era Palocci, quando tínhamos um político de confiança do presidente, capaz de ouvir mentes que considero brilhantes como Marcos Lisboa, Murilo Portugal, Joaquim Levy e Daniel Goldberg.
Neste caso, o estresse recente foi um exagero e os ativos brasileiros estariam oferecendo um excelente ponto de entrada. Tudo isso, claro, feito sob o devido dimensionamento das posições. Ou seja, conforme seu perfil de risco, e a devida diversificação de carteira, com as respectivas proteções associadas.
Não faria o movimento de comprar mais ativos de risco locais, sem posições bem firmadas em caixa (o CDI paga hoje quase 14%) e proteções tradicionais (ouro e dólar).
Se não estivermos diante de um Jaiminho, o personagem do Chaves que só quer evitar a fadiga e que evitaria a quantidade de trabalho a ser feita, há espaço para aprimoramento da conjuntura local. A ver.
Por Paulo Nascimento Filho, empresário, assessor de investimentos, influenciador e criador de conteúdo sobre finanças e educação financeira.
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